Foi aprovada agora há pouco na Comissão de Direitos Humanos do Senado, o Projeto de Lei da Câmara nº 20, de 2010 (PL nº 4.053, de 2008), do Deputado Régis de Oliveira, que dispõe sobre a alienação parental e altera o art. 236 da Lei
nº 8.069, de 13 de julho de 1990. A matéria foi relatada com competência e precisão pelo senador Paulo Paim (PT-RS) que soube compreender a urgência da matéria que agora segue, em caráter terminativo, para a Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Após a aprovação nesta última comissão, se não houver alterações no texto, a lei será sancionada pelo presidente da República. Confira abaixo a íntegra do relatório.
I – RELATÓRIO
O Projeto de Lei da Câmara n° 20, de 2010, resulta de substitutivo acolhido pelas comissões daquela Casa ao projeto original do Deputado Régis de Oliveira. A matéria, apresentada em onze artigos, define o que é alienação parental, fixa parâmetros para a sua caracterização e estabelece medidas destinadas a coibir e punir essa prática.
A alienação parental, de acordo com o art. 2º da proposição em exame, ocorre quando um dos genitores, avós ou responsáveis interfere na formação psicológica de crianças e adolescentes de modo a fomentar o
desenvolvimento de repúdio ao vínculo com o outro genitor. São exemplos de alienação parental contidos no PLC: a realização de campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade; a imposição de dificuldades ao exercício da autoridade parental; a criação de obstáculos ao contato e convivência de criança ou adolescente com genitor; a omissão, para o genitor, de informações
relevantes sobre a criança ou o adolescente; a apresentação de falsas denúncias para impedir ou dificultar a convivência do filho ou da filha com genitor.
O projeto caracteriza a alienação parental como ocorrência que fere o direito fundamental da criança e do adolescente de usufruir de convivência familiar saudável. Classifica tal alienação como abuso moral
contra a criança e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade familiar ou decorrentes de tutela e guarda (art. 3º).
O art. 6º prevê medidas a serem adotadas em juízo para inibir as ocorrências ou reduzir os danos eventualmente verificados. Tais medidas contêm uma gradação de acordo com a gravidade identificada, de modo que os juizados poderão adotar desde a advertência, nos casos mais simples, até a
suspensão da autoridade parental. Também estão previstas outras ações, como a inversão da guarda, a imposição de multa, o acompanhamento psicológico e a fixação em juízo do domicílio da criança ou adolescente.
O projeto também permite a mediação para solucionar os conflitos antes do processo judicial ou no curso dele (art. 9º), além de estabelecer penalidade para os casos de apresentação de falsas denúncias
destinadas a restringir a convivência da criança ou adolescente com um de seus genitores (art. 10).
Na Câmara dos Deputados, a matéria foi debatida em audiência pública realizada em outubro de 2009, contando com os seguintes participantes: Dra. Maria Berenice Dias, Vice-Presidente do Instituto
Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM); Dr. Elizio Luiz Perez, que atuou na consolidação do pré-projeto; Dra. Cynthia Corrêa Araújo Ciarallo, representante do Conselho Federal de Psicologia; Sra. Karla Mendes, vítima de alienação parental na infância e adolescência; Dra. Sandra Báccara, especialista em psicologia familiar e infantil.
Aprovada conclusivamente pelas comissões técnicas daquela Casa, a matéria foi remetida à revisão do Senado Federal. Veio, então, à deliberação deste colegiado, antes de seguir para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que sobre ela se pronunciará em decisão terminativa.
Não foram apresentadas emendas no prazo regimental.
II – ANÁLISE
Cabe, agora, pronunciamento desta Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa acerca da proposição, nos termos do art. 102-E do Regimento Interno do Senado Federal.
O projeto atende às exigências constitucionais relativas ao processo legislativo, considerando que respeita os limites de competência estabelecidos pela Carta Magna e não interfere na esfera de atuação dos
outros Poderes da República.
A matéria obedece aos requisitos de juridicidade e técnica legislativa, pois tem caráter de inovação no mundo jurídico, não fere outras regras já estabelecidas, tem caráter coercitivo e traz conteúdo de abrangência
geral.
Ademais, a proposição possui inegável mérito, já que busca interferir no âmbito privado para proteger crianças e adolescentes de práticas autoritárias e tirânicas que, na tentativa indevida de enfraquecer laços
afetivos, causam sérios prejuízos psicológicos.
É de fundamental importância, portanto, que o Estado atue nesse aspecto, pois crianças e adolescentes compõem o segmento mais vulnerável no caso de conflitos familiares relacionados ao exercício parental.
Em reforço a nossa tese, lembramos uma das conclusões dos debates da audiência pública realizada pela Câmara dos Deputados: a alienação parental, também chamada de implantação de falsas memórias, é
forma de abuso emocional, que pode causar à criança ou ao adolescente sérios distúrbios psicológicos.
Nesse sentido, não há dúvida de que também representa abuso do exercício do poder familiar e desrespeito aos direitos de personalidade da criança.
Somos favoráveis à proposição em exame porque ela define o problema, traz exemplos que irão facilitar as interpretações no mundo jurídico e apresenta um rol de medidas a serem adotadas, sempre considerando a
gravidade do caso. Destacamos, ainda, que as regras previstas permitem a atuação do poder público em benefício de crianças e adolescentes que, de outra maneira, ficariam à mercê de práticas danosas verificadas justamente no ambiente familiar.
Salientamos, por oportuno, que a proposição, além de dar concretude ao ordenamento constitucional que manda família, sociedade e Estado manter crianças e adolescentes a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração violência, crueldade e opressão (art. 227, CF), também preserva os outros institutos jurídicos em vigor que tratam da proteção da infância e da adolescência.
De fato, a proposta coaduna-se tanto com a Lei nº 8.069, de 1990, que institui o Estatuto da Criança e do Adolescente, quanto com a Lei nº 11.698, de 13 de junho de 2008, que trata da guarda compartilhada, mas se configura como norma autônoma garantidora de direitos relacionados especificamente ao exercício da autoridade parental.
Estamos de acordo, ainda, com a atuação de mediadores na busca de solução para conflitos envolvendo laços entre parentes e crianças e adolescentes, conforme prevê o PLC em exame, que fixa condições para a
prática da mediação, bem como seus limites, prazos e submissão ao processo judicial.
Entendemos, portanto, que a matéria permite ao Estado agir em um campo de inserção extremamente difícil, que é o das relações privadas no âmbito de cada residência, de cada família, sempre que haja casos de abuso de poder parental, hipótese que exige o estabelecimento de medidas legais para salvaguardar aqueles que mais necessitam de amparo do Poder Público: nossas crianças e adolescentes.
III – VOTO
Em vista da argumentação apresentada, somos pela aprovação do Projeto de Lei da Câmara nº 20, de 2010.
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